Qual é o papel principal de Tras los Muros?
Tras los Muros é um projeto direcionado principalmente para a fotografia, que procura uma reação do público mostrando as injustiças horríveis que os animais sofrem em diferentes contextos, onde são agredidos e onde a sua vida se acaba. É um meio, não um fim, que pode ser entendido como um marco estratégico a longo prazo.
O espécismo, ou seja, a descriminação a que são sujeitos os animais por não serem humanos é um sistema estruturado de opressão que é intrínseco em qualquer sociedade. À margem das convicções, do modelo político ou cultural, os animais são agredidos de infinitas maneiras, cada uma mais dura e mais brutal.
As consequências desta discriminação representam a maior injustiça conhecida, tanto em número – quantidade de animais mortos- como em intensidade. Acabar de raiz com esta situação – se queremos evitar que se prolongue – implica transformar a sociedade desde as suas bases.
Tras los Muros foca-se neste marco estratégico. Para combater uma injustiça é preciso torná-la visível, com uma intenção concreta. Com as imagens que são acompanhadas de uma reflexões e propostas – daí que se peça para citar a fonte – procura-se uma reação. Mas além da compaixão que temos pelo indivíduo que transmite a sua dor numa fotografia, é preciso que as imagens despertem a solidariedade nas pessoas e que se sintam motivado no compromisso de combater esta injustiça.
Não basta ter pena, é preciso ser solidário e agir pelos que são oprimidos. Só vai acontecer alguma coisa se nos juntarmos e trabalharmos na direção da justiça, ou seja, se conseguirmos converter o sentimento que uma determinada situação nos deixa, como a raiva ou a tristeza, em ações organizadas para acabar com ele.
As imagens vistas num determinado contexto estratégico têm esse poder.
Quais são as dificuldades encontradas na execução do trabalho
As principais são duas: a emocional e o acesso aos locais.
A dor que respiras nestes locais segue-te até casa. A isto soma-se a impotência de lutar contra corporações muito poderosas, tradições e hábitos muito enraizados. Vais a lugares e partilhas experiências com aqueles que agridem os animais e voltas para casa com um punhado de imagens …
Por isso esforço-me para fazê-lo o melhor possível. Cada vez que descarrego um cartão no computador e vejo o que as imagens não transmitem tudo aquilo o que vivi, sinto-me com raiva de mim próprio, porque sinto que lhes falhei.
Por outro lado, para aceder a estes lugares as vezes é complexo. Às vezes à espera é longa, a entrada pode ser secreta e em ambiente tenso, às vezes tens que entrar sem autorização, com o risco de seres capturado por uma câmara de vídeo vigilância ou por algum empregado. Apenas nos lugares públicos onde não é preciso dar explicações, a tensão é uma constante que se soma à brutalidade que estás a vivenciar, a dificuldade de te concentrares num plano, num olhar ou numa questão concreta.
Na tua opinião, qual deve ser a relação do fotojornalismo durante uma reportagem (sendo a temática o ativismo fotográfico)?
Apesar de apresentar algumas semelhanças com o fotojornalismo, como a técnica ou o processo, a sua natureza é outra. A câmara que utilizo é um meio com o qual se pode fazer fotojornalismo ou com o qual se pode fazer ativismo. Eu faço este último. Muitos fotojornalistas fazem ativismo com a sua câmara e outros começam pelo fotojornalismo e acabam emergidos em projetos militantes. Mas também acontece o contrário.
No meu caso considero-me um ativista com uma câmara e um posicionamento muito bem definido com uma estratégia e enquadramento muito bem definido. Também faço design gráfico como ativista, mas não me considero um designer, mas um militante que utiliza o que sabe.
O papel do ativista com uma câmara é retratar as injustiças da maneira que mais favoreça as vítimas para criar uma reação mais rápida e efetiva contra algo que não deveria existir.
Que método utilizas para documentar algumas cenas, sem entrar em conflito com o que estás a fotografar?
Quando decido ir a um local concreto para documentar o que se passa, analiso-o e faço-o por considerar que é o melhor que posso fazer. E é esta ideia, a de compreender a importâncias das imagens que posso conseguir e utilizar toda a minha energia para me concentrar em conseguir tirar o melhor de mim para não falhar aos animais, acompanha-me em cada local que visito.
As emoções, essas aparecem depois, quando deixo para trás os locais de exploração.
Que conselho darias a quem gostaria de seguir a carreira de fotojornalistas / ativista?
O fotojornalistas é alguém que usa a câmara para fazer jornalismo, apesar das suas semelhanças, como já falei anteriormente, isto não é fotojornalismo.
Eu utilizo a câmara e dou forma a este projeto como um marco de luta. É uma ferramenta, mais do que parte de uma forma estratégica a longo prazo, que se enraíza com outros projetos militantes.
Na grande maioria das reportagens, onde se foca os abusos e as agressões que os animais são vítimas, com exceção de alguns casos, como os de animais que são considerados mais amigáveis ou mais bonitos – as focas, baleias, cães, entre outros – nunca se coloca o foco nas vítimas. Os textos que os acompanham, apelam a uma “neutralidade” que muitos jornalistas ostentam, mas não procuram uma mudança de paradigma, nem traçam uma linha clara entre opressor e oprimido.
Alguém disse uma vez “toma partido, a neutralidade favorece o opressor não as vítimas” e é neste ponto que estamos.
Mais do que aconselhar, convido a que façam uma reflexão sobre a situação em que se encontram os animais e que se pense se é justo continuarmos com a nossa vida tal e qual como a conhecemos ou se pelo contrário pretendemos orientá-la, fazer um compromisso e lutar.
Não seria o que gostaríamos que fizessem por nós se estivéssemos na sua situação?
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