Este não é apenas um texto sobre veganismo ou ativismo animal—é um apelo à empatia. Um convite para questionarmos tradições que normalizam o sofrimento, mesmo em nome da religião ou da cultura.
O Vínculo Profundo Entre Mães e Cordeiros
Muitas pessoas não sabem que:
- As ovelhas são mães extremamente dedicadas. Assim que os cordeiros nascem, ainda trémulos e com as pernas vacilantes, esforçam-se por ficar de pé para seguir as suas progenitoras. Este instinto é vital na natureza, onde ficar para trás significa morte certa.
- O laço emocional é tão forte que os cordeiros reconhecem o balido da sua mãe entre centenas de outras ovelhas, e vice-versa. Estudos em etologia comprovam que, quando separados, ambos vocalizam desesperadamente—um chamamento que, para quem já ouviu, é impossível ignorar.
- A separação é traumática. Nas explorações pecuárias, os cordeiros são levados para o abate muitas vezes com apenas semanas de vida. As mães perseguem os pastores, balindo em pânico, enquanto os seus bebés são carregados para camiões. Algumas chegam a recusar comida, entrando em stress profundo.
A imagem que mais me marcou foi a de cordeiros a tentar, em vão, atravessar uma cerca para regressar às suas mães. Sabiam instintivamente que algo terrível iria acontecer. Mas, claro, não conseguiram escapar. Estavam marcados para o matadouro.
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A Páscoa e a Normalização da Violência
Esta manhã, enquanto bebia o meu café, deparei-me com uma notícia típica desta época: “Preço do borrego dispara—muitas famílias não vão conseguir comprar este ano.”
As reportagens focavam-se no impacto económico, entrevistando criadores que se queixavam de vender menos, mas lucrar mais devido à inflação. Havia imagens de rebanhos, olhos arregalados de medo, enquanto repórteres comentavam o assunto com a mesma naturalidade com que se fala do preço da gasolina.
Nenhuma palavra sobre o que esses animais sentiram. Nenhuma menção ao facto de que muitos cordeiros são transportados sem água ou alimento, em viagens longas, até ao seu destino final: uma faca na garganta, perante os gritos dos outros.
Tradições Religiosas e a Romantização do Sacrifício
Cresci numa família católica e, como muitas crianças, frequentei a catequese. Lembro-me das histórias sobre o “Cordeiro Pascal”, símbolo de pureza e sacrifício. Nunca me foi explicado que, por trás dessa metáfora, havia—e ainda há—milhões de animais reais a morrer.
Em certas regiões de Portugal, há até costumes arrepiantes:
- Oferta de cordeiros vivos a professores ou figuras locais, como se fossem brindes.
- Procissões onde crianças carregam borregos ao colo, ignorando o seu tremor de medo.
- Abates públicos nalgumas aldeias, disfarçados de “tradição cultural”.
Tudo isto é justificado com um “sempre se fez assim”, como se a tradição fosse uma licença para a crueldade.
Porque é Tão Difícil Mudar?
A resistência a questionar estas práticas vem de vários fatores:
- Dessensibilização – Quem não vê o sofrimento, não se comove. A maioria das pessoas nunca visitou um matadouro ou ouviu os gritos dos animais.
- Cultura e religião – Muitos acreditam que a Bíblia “autoriza” o consumo de carne, ignorando que Jesus falava de compaixão (“Misericórdia quero, não sacrifício” – Mateus 9:13).
- Interesses económicos – A indústria pecuária lucra milhões com a Páscoa, e há todo um sistema que depende desta exploração.
Mas será que, em 2025, ainda precisamos de celebrar a vida com morte?
Uma Páscoa Mais Ética é Possível
Felizmente, cada vez mais pessoas estão a rejeitar esta violência desnecessária. Se queres uma Páscoa verdadeiramente compassiva, aqui estão algumas alternativas:
1. Substituir o Borrego por Pratos Vegetais
- “Borrego” de seitan ou jackfruit – Temperado com alecrim e alho, fica surpreendentemente parecido.
- Empadão de lentilhas – Rico, reconfortante e cheio de proteína.
- Cozido à portuguesa vegan – Com “carne” de soja e legumes frescos.
2. Doces Sem Exploração
- Folar sem ovos – Feito com puré de maçã ou sementes de linhaça.
- Queijadas veganas – À base de leite de coco e farinha de amêndoa.
- Pão-de-ló sem ingredientes animais – Sim, é possível!
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3. Educar e Partilhar
Se fores a uma ceia familiar, leva um prato vegan e partilha a tua escolha com gentileza. Muitas pessoas nunca consideraram que há outra forma de celebrar.
Reflexão Final: Um Mundo em Crise – Da Crueldade Animal à Violência Humana
Vivemos numa era de contradições brutais. Enquanto discutimos o sofrimento dos cordeiros na Páscoa, milhões de seres humanos são massacrados em Gaza, sob o olhar passivo do mundo. Enquanto nos horrorizamos com a separação das ovelhas e dos seus filhos, crianças palestinianas são enterradas sob os escombros das suas próprias casas, vítimas de uma máquina de guerra financiada e apoiada por potências globais.
Na Ucrânia, a guerra arrasta-se há anos, com vilas inteiras reduzidas a pó, famílias separadas e um futuro incerto. Enquanto isso, o nosso planeta arde, enche-se de plástico e perde biodiversidade a um ritmo alarmante – tudo em nome do “progresso” e do lucro imediato.
O que une todas estas formas de violência?
A dessensibilização. A mesma indiferença que permite que um cordeiro seja esquartejado como “tradição” é a que normaliza bombas a caírem sobre hospitais. A mesma lógica de dominação que justifica a exploração animal é a que alimenta guerras por petróleo, terras e poder.
Será que algum dia evoluiremos para além disto?
Para além de um sistema que transforma vidas em números, sejam de animais abatidos, de civis mortos ou de espécies extintas?
A compaixão não é selectiva.
Se queremos um mundo melhor, não podemos lutar apenas pelos que nos são próximos ou convenientes. Temos de questionar todas as formas de opressão – da criação e exploração de animais aos campos de batalha, das florestas destruídas aos bairros arrasados por drones.
Esta Páscoa, enquanto alguns comemoram com o sangue de cordeiros, outros choram os seus mortos em Gaza, na Ucrânia, no Congo, no Sudão… Quantas mais vidas precisam de ser sacrificadas até acordarmos?
O verdadeiro renascimento que esta época simboliza só acontecerá quando rejeitarmos a violência em todas as suas formas. Até lá, continuaremos a girar num ciclo de dor, cada vez mais distantes da humanidade que dizemos ter.
O mundo precisa de menos tradições cegas e mais consciência. Menos silêncio, e mais voz por quem não a tem.
Não escrevo isto para julgar quem come carne, mas para desafiar a normalização do sofrimento. Se choramos quando um cão ou gato é maltratado, porque ignoramos o pânico de um cordeiro?
Esta Páscoa, podemos honrar os valores de renovação e compaixão sem contribuir para a dor. Porque, no fim, a verdadeira tradição deveria ser o respeito por todos os seres.
E tu? Vais experimentar uma Páscoa sem crueldade este ano?